Embora divague e não consiga compreender os seus erros, Grinais sente a pior dor que um amante pode sentir: a culpa da perda. Sabe que, como amante inveterado, romântico nato e sonhador absoluto, privou quem ele tanto quis de todo o universo de amores que irrefutavelmente poderia oferecer. Fingiu-se frio por uma dor que há tempos esse alguém tirara. Quis ser escudo impenetrável, salvando-se de outro amor arrebatador, quando, na verdade, aquele nome peculiar jazia encravado em seu peito, distribuindo toda aquela fluidez virtuosa por cada extensão dos seus vasos sanguíneos. Ainda cego pela conduta demasiada defensiva, não lhe ocorrera que já estava contaminado por aquele demoníaco anjo de voz branda e olhar de fogo. Sua presença já dilacerava seus músculos, percorrendo o seu corpo como o magma nos sulcos da terra que ele lambe com fúria e voluptuosa beleza. Ele era a doença em estágio de cura. E que cura! Impossível não ser invadido por aquela silhueta ninféia de proporções mágicas. Era como abraçar a cintura quase invisível de todo o universo.

E essa substância viva que matava sua solidão, esse ópio que lhe trazia maravilhosas e irreais realidades, essa magia profunda e infindável, numa implosão de assombrosa espontaneidade, se foi para algum lugar melhor que ao seu lado, um lugar desconhecido e vazio, onde a única certeza é aquela que deixa claro que ele, que era templo de tão maravilhosa forma, não mais existia. E tudo se foi, como se nunca tivesse sido. Toda beleza espontânea que nasceu sob o testemunho arbóreo de um mundo recriado evanesceu como as lúgubres brumas que se desintegram numa amedrontadora velocidade ao serem tocadas pela luz dourada dos dias que nascem. Porém, o que nasceu foi uma terrível noite, uma cúpula negra e vazia, sem brilho algum de estrelas ou de luar, um céu refletindo a luz que já não existia. E a cura se foi… o fogo se foi… E a já tão vaga e distante voz de dríade ígnea ainda entoa as canções de dias que devem ser esquecidos, lembrando da dor e da conseqüente necessidade amnésica que embala o agora. É, no entanto, necessário que se compreenda que o vazio é o estágio que antecede a criação, sendo assim, agora ele é gênese.

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